Meu emprego CLT é de editor de vídeo, especificamente para telejornais. A área na qual trabalho é chamada de hardnews. São as notícias difíceis. Não porque sejam trágicas ou penosas de dar — embora muitas vezes sim, seja o caso — mas, me parece, porque são duras na sua confecção. Quem trabalha com hardnews precisa ser ágil, tomar decisões rápidas, ser pragmático. Quanto menor o tempo entre a ocorrência do fato jornalístico e a transmissão da matéria finalizada e bem acabada, maior a nossa competência e mais relevante torna-se o telejornal.
E, ainda assim, trabalhamos com emoção. Se a matéria é sobre uma tragédia, é meu objetivo causar no espectador algum tipo de desconforto, de dor, tristeza ou até indignação. Se é sobre um evento festivo, eu quero contagiar o público, mexer com o ânimo. Se é uma história de superação, eu quero que a audiência se sinta inspirada, que seus olhos se encham de água.
Considero um processo truncado, o de “comunicar emoções”. Entendo que tem a ver com repertório, meu e do público. Se até numa fala objetiva não há garantias de que o interlocutor receba a informação como o emissor gostaria, quando se trata de algo tão subjetivo quanto sentimentos o processo é ainda mais incerto.
Portanto, eu miro em sensações genéricas. Quero causar alegria, quero causar tristeza, quero inspirar positivamente. São emoções deliberadamente abrangentes simplesmente porque é o que parece possível. O fenômeno já é incerto, não há porque tentar ser ainda mais específico e correr o risco de não comunicar nada, ou pior, causar um efeito contrário. A ideia de o espectador rir de algo que deveria ser trágico me vem como um fracasso, uma incompetência.
Eu pensava que não era possível comunicar emoções muito específicas, sentimentos muito delimitados, principalmente para uma grande quantidade de gente. Pensava. Até assistir e ver a repercussão de Ainda Estou Aqui.
Estou certo de que você sabe do se trata, mas vou relembrar brevemente. É um filme brasileiro de 2024, estrelado pela genial Fernanda Torres e dirigido pelo também genial Walter Salles. Baseado no livro do Marcelo Rubens Paiva, o filme tem a maioria de seu enredo em 1971, no episódio real do desaparecimento do Rubens Paiva — pai do Marcelo — durante a ditadura militar. Vemos o ex-deputado vivendo seus dias com sua esposa e seus cinco filhos em uma bela casa em frente à praia do Leblon, até ser “convidado” a prestar um depoimento, sair e não voltar nunca mais. Então acompanhamos a esposa, Eunice Paiva (Fernanda Torres) que além de também ter estado presa por dias, sofre a dor absurda de não ter qualquer informação sobre o que aconteceu com o marido. Vemos como ela se mantém firme, convicta da necessidade de ser o maior pilar da família, ao mesmo tempo que não abandona a luta por reparação, nunca deixa de denunciar o que aconteceu.
É uma história impressionante, contada com perfeição. Não uso esta palavra levianamente. Este filme é perfeito. Considero um dos melhores que já vi na vida. Não é à toa o impacto que vem causando nas pessoas pelo mundo, desde suas primeiras exibições em Veneza.
É um filme triste, uma tragédia, uma injustiça, ao mesmo tempo que é um conto de resistência e superação. Mas eu, que choro fácil em qualquer Meu Malvado Favorito, não chorei ao longo do filme. Não que não estivesse impactado, chocado, triste, é que as lágrimas não desceram. Elas estavam lá, na espreita, mas sempre suspensas. Foi como se a força que Eunice encontrou, sabe-se lá onde, me contagiasse. Ela não chora, então eu não podia chorar. E ao mesmo tempo, quando o filme acabou, naquela última cena com a Fernanda Montenegro, eu desabei. E desabo de novo agora, escrevendo.
Excelente filme, impecável, impressionante, impactante. Mas o que me surpreendeu mesmo aconteceu depois. Primeiro, o silêncio. O cinema estava lotado, mas era como se estivesse vazio, a julgar pelos ruídos do público. Quando acabou, na minha sessão não houve palmas, mas houve um silêncio, daqueles que chamam a atenção. Por minutos, ninguém se levantou, ninguém falou, ninguém parecia capaz de qualquer coisa que não fosse absorver o que havia vivido.
Então, enquanto os créditos rolavam, as pessoas foram se levantando e saindo da sala. Havia algum burburinho, mas no geral, pareciam incapazes de conversar. Sons de fungadas e lágrimas contidas. Fui assistir com minha esposa e nossa filha de treze anos, e ambas saíram da sala zonzas. Eu não estava diferente. Passados alguns minutos conversamos sobre o filme, perguntei à minha filha se ela tinha gostado. Ela disse que era uma das melhores coisas que já tinha assistido. Que nunca havia pensado muito sobre a ditadura. Que passara o filme com uma sensação de sufocamento, como se não fosse possível falar. Então a ditadura era assim, ela estava concluindo.
Fiquei admirado e inflado de orgulho pela maneira como ela havia se conectado. Ainda Estou Aqui é excelente, mas não tem o ritmo de um blockbuster, um filme comercial convencional. Ao assistir, considerei que talvez não funcionasse com o espectador ocasional, menos ainda com adolescentes de treze anos na era do Tik-Tok. Pelos longos silêncios e seus momentos contemplativos, achei que fosse um filme só para cinéfilos.
Bom, acho que a bilheteria fala por si. Eu estava totalmente equivocado.
Mas o que eu achei mais interessante e chamou minha atenção para a genialidade da obra, é que o impacto que o filme teve em mim, na minha filha e na minha esposa parece ser o impacto que ele tem na maior parte dos espectadores. Desde que assisti, tenho consumido avidamente tudo o que repercute Ainda Estou Aqui. De críticas e resenhas especializadas a comentários individuais de espectadores comuns, de dentro e de fora do Brasil. E é praticamente unânime a reação. Um choro represado, um nó na garganta que vai se desfazendo só depois que o filme acaba.
Ainda Estou Aqui causa a mesma emoção em quase todos os espectadores. E não é uma emoção genérica, abrangente, é uma emoção específica, um tipo de sentimento direcionado que encontra eco na alma de quem quer que o assista.
Eu não sabia que isto era possível. E para além desta assertividade, que seria admirável em qualquer história, há uma coerência sobre esta sensação. Além do impacto que causa no espectador, além da competência impressionante na comunicação de uma emoção, trata-se de uma que serve lindamente à trama. Ele comunica o que se sente em uma ditadura. Minha filha entendeu muito mais sobre o período assistindo o filme do que seria possível com qualquer aula de história.
E, apesar da angústia, a história caminha para um relaxamento. Não é uma redenção, não é uma liberação. É uma reparação. Imperfeita, conseguida às custas de muita insistência e ainda assim fatalmente insuficiente. Rubens Paiva não volta, seu corpo não é encontrado, a família nunca mais é inteira novamente. Há, para sempre, o vazio que ele deixou, que sequer pôde ser ocupado pela certeza da morte. Sabe-se que ele morreu mas, sem um corpo, será para sempre uma hipótese muito bem fundamentada no emocional dos entes queridos. Ainda assim, as reparações existem. São poucas, pequenas, um atestado de óbito, um reconhecimento na comissão da verdade. Reparações falhas, incipientes, como, aliás, reparações costumam ser.
É uma obra redonda, bem acabada, polida, verdadeiramente impecável. Não assisti filme melhor nos últimos anos.
Mas estas sensações, este sufocamento, não me eram estranhos. Eu havia sentido algo semelhante não fazia muito tempo, e em outro filme sobre uma ditadura.
Zona de Interesse começa com uma tela preta. São bons minutos de uma escuridão completa, com um som ambiente que também não tem qualquer coisa de especial. Acho que eu não fui o único a me perguntar se era isso mesmo, ou se minha TV estava com defeito. Era assim mesmo. No começo do filme estamos cegos, só nos resta ouvir.
Então acompanhamos a vida de uma família alemã, saudável, ordeira, amorosa entre si até. Eles tem um quintal, as crianças brincam em uma piscina, a mãe cozinha para todos. Eles jantam juntos. Um retrato, aliás, MUITO parecido com o ideal do american way of life dos anos cinquenta. Estes alemães vivem uma vida altamente instagramável, se o instagram existisse no começo dos anos quarenta.
Ah, claro, são alemães no começo dos anos quarenta. Isto quer dizer que são alemães durante a guerra. Na verdade, a guerra é muito mais importante para o contexto do que as crianças felizes na piscina dão a entender. A família é nazista. O pai é o gestor do campo de concentração de Auschwitz. O mais infame dos campos de concentração, aliás, divide muro com o terreno da pacata família. E com outros terrenos, de tantas outras famílias de funcionários empregados para a atrocidade.
O filme tem uma calma perturbadora. As pessoas estão vivendo suas vidas alheias ao que acontece do outro lado do enorme muro. E o espectador nunca é colocado de frente com as crueldades do holocausto. Não visualmente, ao menos. Toda a relação com o campo de concentração é construída através dos sons. Sirenes, ordens, gritos, são os elementos que não podem ser contidos por um muro. Só nos resta ouvir.
Ainda assim, os moradores da agradável vila nazista parecem entender que faz parte de seus deveres civícos ignorar a tragédia adjacente às suas vidas. Se pudessem isolar acusticamente Auschwitz, não há dúvida que teriam feito.
Entendo Zona de Interesse como um filme no qual a trama importa menos que a ambientação. Os horrores da guerra já foram bastante expostos — embora eventos recentes me façam acreditar que nunca será o suficiente. Mas este é um filme que resolve abordar a questão de outra forma, expor outro tipo de horror. Existe movimento na trama. O pai é transferido, a mãe se preocupa em cuidar dos filhos, mas tudo isso me pareceu superficial. Prestar atenção nos dramas da família me demandou um esforço, como se eu também tivesse que silenciar aquele contexto abominável dentro de mim.
A pegadinha é: não dá. Não se silencia. Não se ignora. Eu não consigo e a família também não consegue, por mais que tente e se dedique a fingir que é capaz. A tragédia existe, deixa marcas profundas. É inignorável.
O que se consegue, no caso de Zona de Interesse, é uma angústia entalada. Uma sensação de sorriso forçado, completamente desprovido de alegria. Me senti um pouco louco, como se estivesse assistindo Friends ou qualquer outro sitcom, mas ao invés de provocar risada, as situações mexiam comigo como uma ficção científica de um futuro distópico sem qualquer tipo de esperança.
E essa é precisamente a premissa de Kevin Can F*ck Himself, uma série estadunidense de 2021. Ao dar o play no primeiro episódio, o espectador é introduzido a uma estética familiar de sitcom. É claramente filmada em estúdio, não se vê a quarta parede do cenário, é extremamente iluminada, colorida, as interpretações são canastronas, e tem claque. Os atores esperam a plateia parar de rir para continuar o texto.
Na trama, o tal Kevin (que você vai concordar que deveria f*ck himself) é um clássico marido crianção. Vê-se que é um homem com idade ao redor dos quarenta, mas ele ainda passa todo o tempo livre com o melhor amigo e vizinho que está sempre de boné (virado pra trás). A protagonista é a esposa do Kevin, a Allison, que desempenha a função de “adulta” nas situações. Além de trabalhar, ela cozinha, cuida da casa, junta as latas de cerveja espalhadas, lembra Kevin e os amigos que não é uma boa ideia brincar de pular na mesa de centro.
E esta mesma esposa é matéria-prima para a maior parte das piadas do Kevin e dos amigos. Estão sempre planejando a próxima festa, a próxima empreitada divertida, e Allison é vista como estraga-prazeres. Alguém para se evitar, se enrolar. Ela é sempre lembrada de que é um peso na vida de Kevin, que fez a besteira mais antiga que um homem pode fazer: se casar. Tudo isso ao som de risadas e mais risadas de um público invisível. Como Friends, como Seinfeld e tantas outras.
É claro que, em 2024 quando assisti, já não dava mais para achar graça nesse tipo de situação. O desconforto da série começa aí, com o público exposto a algo que tem toda a estética de sitcom, com piadas que até dá pra entender onde estaria a graça, mas que já não funcionam mais. A Allison está factualmente exposta a uma relação abusiva. Factualmente. É só listar o que se vê para concluir.
Mas apesar do incômodo, era difícil, parar mim, sentir esse abuso. Claro, não sou mulher e não tenho certos gatilhos. Mas mais do que isso, a estética, a trilha, a própria maneira como a Allison reage, como se não se importasse, faz com que tudo pareça inconsequente, sem muita gravidade.
É então, cara leitora, que a série se torna genial. Ainda nos primeiros minutos do primeiro episódio, depois de uma das muitas humilhações “divertidas” que a Allison sofre, ela sai de cena sozinha. E a perspectiva do público a acompanha. Quando ela entra na cozinha, tudo muda. As cores ficam cruas, o cenário é uma locação, com enquadramentos que mostram todo o entorno, Allison não sorri e há um silêncio. Não há mais claques, não há mais risadas. Não há mais Kevin.
E esta é a dinâmica da série toda. Quando Kevin está em cena, é um sitcom. Quando ele não está, é um drama de uma mulher presa em um relacionamento abusivo — que na verdade vai virando um thriller, mas não quero spoilear. O que dá pra falar é que a Allison não é tão indiferente quanto parece nos momentos de comédia. Aliás, não é nada indiferente.
Nos momentos sem o Kevin, a vida da Allison parece um buraco. Ela tem um emprego de merda, numa cidade de merda, com “amigos” de merda. Coloquei aspas nos amigos, porque ela percebe que todos os amigos que ela teria, na verdade, são do marido. Até que ela reencontra um interesse da época do colégio e lembra que, antes do esposo bostinha acontecer, ela era outra pessoa, com muito mais amigos, com muito mais alegria de viver.
Essa exposição da tragédia pessoal transformou para mim as cenas no formato de sitcom ainda mais perturbadoras. O humor se torna completamente vazio, como se todos ali estivessem fazendo um grande esforço para manter uma euforia doentia, um estado de ânimos insustentável para a crueza daquela realidade. E as claques, as risadas da plateia, causam ainda mais sofrimento do que quando a Allison está deprimida no outro formato. Quando a série é um drama, ao menos ela está vivendo sua tristeza. Na sua vida de comédia ela sequer tem esse luxo.
Será que estes três exemplos configuram uma tendência? Ou é meu radar que está encontrando padrões por si mesmo?
Se for uma tendência, penso que há razão de ser. Esta sensação, de ter que fingir que está tudo bem ou, no caso de Ainda Estou Aqui, tentar se convencer a seguir a vida apesar do sofrimento, bateu pra mim em um lugar muito familiar. Como se eu mesmo tivesse experienciado isso recentemente. Investigando qual era esse lugar familiar, encontrei a pandemia.
Acho que ainda estamos lidando com o que aconteceu — oficialmente — entre 2020 e 2023. Não sei vocês, mas eu sinto que não tenho distanciamento suficiente para elaborar de forma satisfatória o que vivi. Consigo comentar em conversas, mas é como se eu criasse uma distância do assunto, como se eu tivesse visto em um livro, ou assistido em um jornal. Eu não me atrevo a lembrar realmente como eu estava me sentindo.
Quando penso no isolamento, na impossibilidade de estar com pessoas que eu amo, no medo constante de infecção, na sensação que eu estava lutando contra o próprio ar, na falta de perspectiva sobre qualquer coisa que nos salvasse, que fizesse tudo acabar, nas máscaras que eu tinha que usar o tempo todo, em todo lugar, ainda é dolorido. Na verdade, ainda é sufocante. Até hoje existem dias que eu chego no trabalho e sinto meu rosto nu, como se estivesse faltando algo. Aí lembro que não preciso mais usar máscara.
E qual foi a maneira que eu, e a maior parte das pessoas que eu conheço, encontramos de lidar com isso? Nenhuma. Seguimos nossas vidas. Nos entretemos como pudemos, nos abraçamos nas nossas bolhas, contornamos o que estava acontecendo e tentamos manter a rotina tanto quanto possível. Enquanto o mundo parecia acabar, enquanto não sabíamos quais seriam as consequências da tragédia que estava acontecendo. E, quando vieram, as consequências não foram leves.
E depois de contados os corpos, depois de termos um número para o tamanho da merda, a vida continuou. Lembro quando, no comecinho, fantasiávamos com o momento em que a pandemia acabasse. Correríamos pela rua, abraçaríamos os entes queridos distantes, abraçaríamos estranhos, iríamos em festas e mais festas. Não sei você, mas eu não vi isso acontecer. Não exatamente.
Claro que extravasamos como pudemos. Cantei “ano passado eu morri mas esse ano eu não morro” no bloco de carnaval, seminu, com outras pessoas seminuas, deliberadamente compartilhando germes em perdigotos livres de culpa. Mas foi pontual. E, principalmente, melancólico. Foi algo que fiz porque estava engasgado. Muito mais uma tentativa de “pegar no tranco” do que uma redenção para tudo o que vivemos.
Não há redenção, não ainda. O impacto da tragédia permanece, ainda estamos lidando com ele, talvez vivendo uma espécie de pós-trauma coletivo. E em certos aspectos, nossa sociedade provavelmente foi ressignificada para sempre.
Coloquei tudo no mesmo balaio, mas existem diferenças importantes entre os fatos fictícios. Especificamente entre Ainda Estou Aqui e os outros. Em Zona de Interesse e Kevin Can F*ck Himself tenta-se ignorar o trágico, ou o perverso. É uma posição ativa, uma escolha por não lidar com a treta em questão. Os conflitos, nestes casos, poderiam ser (e às vezes eventualmente são) encarados de frente, e outras abordagens poderiam surgir disso. A cura, ou algo que o valha, poderia vir dessa opção pelo confronto, mas não é a escolha dos personagens.
Em Ainda Estou Aqui, como me parece ser o caso da pandemia, realmente não havia muito o que fazer. A opção por continuar a viver e, dentro do possível, tentar evitar que a tragédia se torne um peso insustentável, parece ser a única possível. Eunice não age como se fizesse uma escolha, age como se não tivesse escolha. Ela precisa sustentar os filhos, precisa manter a família unida diante da dor da perda, precisa lidar com seus próprios demônios enquanto procura respostas para o que aconteceu com o marido.
Eunice não está fingindo, está agindo, constantemente. Quando ela diz, na ocasião da foto para a revista “nós vamos sorrir, sorriam!”, ela não está empurrando uma alegria mentirosa, está procurando o que restou. E está encontrando. Mais do que isso, está sorrindo para quem a violentou. Está dizendo “não vou deixar você dizer como eu devo me sentir”. Literalmente.
Mas a tragédia permanece, sempre. Não há como superar, apenas se acostumar. Ao final da vida, já interpretada pela Fernanda Montenegro, Eunice ainda reage aos desdobramentos da história do desaparecimento do marido.
A pandemia ainda está entre nós, ainda permeia nosso imaginário, nossos inconscientes, nossos traumas. É um trauma coletivo, que ainda não tivemos tempo de processar. E talvez seja justamente esse padrão, o fato de que é um sentimento coletivo, que faz Ainda Estou Aqui tocar exatamente da mesma maneira em tantas pessoas.
Ou talvez o Walter Salles não estivesse tão preocupado com isso. Talvez ele estivesse preocupado com a verdade, com a verdade da tragédia, com a verdade da personagem. Talvez seja isso que ressoe, a realidade da coisa. Talvez nos toque porque seja verdadeiro e porque, talvez, nós não sejamos tão diferentes uns dos outros assim.
A partir desta edição, não enviarei mais os microcontos aqui na baseado em fatos fictícios. Eles continuam todos na minha página do instagram, fatos fictícios. Paro porque estou criando uma newsletter nova, para compartilhar meus textos de ficção. Os microcontos serão publicados por lá, junto com contos propriamente ditos e talvez outros formatos, sempre ficcionais. Na próxima edição da baseado — sim, eu notei o trocadilho ao escolher este apelido para a minha newsletter — dou mais detalhes.
Viver a tragedia é a dimensão invisível do Ser ou não Ser, negar o trágico. Nossa liberdade e nossa prisão .
Mica, que texto lindo <3